Autores tentam usar fenômeno que ocorre (raramente) no mar da Galileia (ou lago de Genesaré) para explicar dois milagres descritos nos evangelhos; entenda.
Recentemente o pesquisador israelense Yael Amitai (junto a outros cientistas) publicou um artigo científico intitulado: Mortes de peixes induzidas por Seiche no Mar da Galileia – uma possível explicação para milagres bíblicos? (título original: Seiche‐Induced Fish Kills in the Sea of Galilee – A Possible Explanation for Biblical Miracles?). Para que iniciemos de forma clara vale dizer que o “Seiche” é um fenômeno natural que ocorre em ambientes de lago ou água confinada e esse fenômeno gera movimentos anômalos na água podendo alterar significativamente a temperatura, conteúdo de oxigênio, etc.
No artigo os autores tentam usar esse fenômeno que ocorre (raramente) no mar da Galileia (ou lago de Genesaré) para explicar dois milagres descritos nos evangelhos de Marcos, Lucas e João: a pesca maravilhosa (ou milagrosa) e a multiplicação de pães e peixes. Esse artigo foi divulgado por diversos portais de notícias e é interessante como a atração por qualquer coisa que tente (inutilmente) invalidar o poder sobrenatural de Jesus ganha espaço rapidamente. No entanto, deixarei minha opinião sobre isso mais para o final.
Sejamos científicos:
O artigo é muito bom. Apresenta resultados importantes sobre a variação da temperatura, intensidade e mudança dos ventos que alteram a profundidade do lago, conteúdo de oxigênio e/ou falta dele devido à floração excessiva do fitoplâncton (algas fundamentais para oxigenação da água). Eles usam novos métodos, fazem modelos computacionais modernos e entregam aos cientistas ferramentas úteis para pesquisas futuras. Ponto. O que é relevante cientificamente acaba aqui.
Mas em uma jogada de marketing, e desculpe o trocadilho, lançando a isca para nos fisgar, ele coloca no título e em duas ou três frases (para que pudesse validar o título) o questionamento/afirmação de que os fenômenos descritos no artigo poderiam explicar os dois milagres de Jesus. Eles afirmam (sem nenhuma prova identificável no texto) que a limnologia[1] pode fornecer uma base científica plausível para esses milagres; que, como o Lago de Genesaré, tem histórico de fenômenos de mortandade de peixes devido ao “seiche” ou ressurgência, isso poderia (atenção ao “poderia”, pois essa é palavra usada) ter ocorrido no mesmo local do lago onde o milagre bíblico dos pães e peixes e presumivelmente, a pesca milagrosa, ocorreram dois milênios atrás.
São essas as únicas duas falas bem vagas e frágeis que eles inserem no artigo. Infelizmente, isso é suficiente para que se tente mostrar aos frágeis crentes que suas crenças são facilmente despedaçadas, enterradas, aniquiladas pela ciência. É uma pena mesmo, mas “onde está o entendimento? Está escondida dos olhos de toda a humanidade” (Jó 28:20) ou “onde está o sábio? Onde está o homem culto? Onde está o questionador desta era? Acaso não tornou Deus completamente insensata a sabedoria deste mundo?” (1 Co 1:20).
AFIRMAÇÕES SEM SENTIDO!
Diante dessas perguntas, e sendo nada, me atrevo a afirmar (muito rapidamente) porque as afirmações não tem sentido?
1) O fenômeno gera morte dos peixes ou então os enfraquece tornando-os mais suscetíveis à pesca. Fato! Mas o que é fake? Estes peixes, sejam mortos ou enfraquecidos, são levados à costa! Literalmente para a praia. O texto de Lucas 5:4 afirma que Jesus diz: “Faze-te ao mar alto”, ou seja, afastam-se da praia. Mais: se você procurar o significado do termo descobrirá que esse “mar alto” se aplica ao ponto do mar onde não se pode mais se avistar a terra! Então não preciso dizer mais nada!
2) O texto ainda afirma que “as redes quase se rompiam”. O rompimento da rede de pesca não se deve ao peso sobre ela colocado, mas sim ao peso associado ao movimento dos peixes. Peixes mortos ou muito enfraquecidos pela falta de oxigênio não se movimentariam, logo, a chance de rompimento da rede era quase que inexistente. Ainda, neste ponto, ressalta-se que sem qualquer condição de armazenamento moderno, nenhum pescador (nem hoje, muito menos naquela época) se arriscaria a levar pra casa milhares de peixes já mortos, sem conhecer a razão disso!
3) Sobre a ocorrência do fenômeno: o próprio artigo afirma que trata-se de algo raríssimo – é necessária um combinação exata de timing e condições. Os registros indicam que isso ocorreu uma vez em 1990, uma vez em 2007 e duas vezes em 2012. Nada, niente, nothing, rien, nitchts, nadica de nada, nenhuma vez mais. Cientificamente, usar um número tão baixo de registros para afirmar que isso “poderia” estar ligado a algo ocorrido a mais de 2000 anos só é uma provocação pensada.
DETALHES DE UM MILAGRE
O dito anteriormente vale somente o milagre da pesca maravilhosa. E o que dizer sobre a tentativa de usar o mesmo argumento para o milagre da multiplicação de pães e peixes? Vale a pena gastar tinta nisso? Não vale! Mas não resisto à provocação:
1) A Bíblia relata uma dupla multiplicação… será que os pães também morreram por falta de oxigênio e foram levados a praia? Uau, talvez esta seja a resposta! Perdoem-me a ironia, mas é irresistível não fazê-lo diante de certas coisas expressas como “científicas”;
2) A primeira multiplicação de pães e peixes ocorreu em Betsaida, a 32km do lago de Genesaré. Então se há alguma tentativa de conexão, precisa ser com a segunda multiplicação de pães e peixes que ocorre (segundo Marcos) nas proximidades do lago em questão. Mas mesmo assim, os textos bíblicos afirmam que foi trazido até Jesus os pães e peixes que foram, então, multiplicados. Inclusive se considerarmos que Lucas era um médico, e que, portanto, era criterioso na forma de escrever, ele provavelmente escreveria que houve uma “coleta” de peixes que estariam mortos ou fragilizados a beira da praia, mas não é isso que lemos;
3) por fim, para não te cansar, os textos afirmam que havia uma preocupação por parte dos discípulos com a falta de alimento nas proximidades de onde estavam reunidos. Se houvesse grande quantidade de peixes disponíveis a beira da praia, essa afirmação que é clara em todos os relatos, não seria feita.
Talvez caiba aqui um argumento extra. Perdoem-me se tenho fé demais, mas aprendo na Bíblia que Jesus tem autoridade sobre tudo e se Ele dominou enquanto aqui esteve sobre qualquer evento, fenômeno ou qualquer lei da natureza, não me surpreenderia em que mais uma vez, segundo Sua vontade, Ele movimenta-se céus, terra, leis, fenômenos, todas as criaturas, a fim de abençoar, cuidar e ensinar aqueles que diante dEle estavam! Há diversos relatos bíblicos, fenômenos incríveis, que são cientificamente explicáveis, mas não cientificamente CAUSADOS!
Por fim, não tenho dúvida: a pergunta no título do artigo, as rasas afirmações feitas no texto foram feitas para instigar os leitores e provocar (como provocou) a ampla divulgação do texto. O objetivo claro foi gerar visibilidade ao artigo… não há nada de científico na pergunta feita e muito menos na resposta dada como tentativa de explicação aos milagres. Foi só um título pensado. Parabéns aos autores por isso. Eles conseguiram chamar a atenção. Mas suas tentativas de invalidar ou justificar os milagres de Jesus, foram inúteis!
Texto: Pr. Tom Dias | Pastor responsável pela Igreja Adventista da Promessa em Vila Helena, Sorocaba (SP). Doutor em Geociência e Pós-Doutor em Cronologia Raios Cósmicos (UNICAMP). Professor Doutor da Universidade de São Carlos (UFSCar).