As relações cibernéticas são mais atraentes quando não queremos descobrir que tipo de gente somos ou estamos nos tornando
Confesso que não resisti. Foi lendo um artigo em que seu autor – Contardo Calligaris – o intitulou de “Amor de Máquina”, que fui quase obrigado a sustentar alguns paradoxos do ponto de vista evangélico. É também uma questão de lógica. Explicarei.
No texto mui atraente, o colunista da folha de São Paulo se inspira em uma explicação um tanto profunda acerca dos relacionamentos e suas bases, apresentado no filme “Ela”, que basicamente se enreda na história de um homem que se apaixona por um sistema operacional, um amor cibernético. Essa é uma tentativa lógica de criar opções para o mundo dos relacionamentos humanos neste tempo. Somos seres sociais, ou não?
Subscreva-se Calligaris: “A tecnologia nos dá a ilusão da companhia sem as exigências excessivas da amizade. Por isso, o sucesso dos amores virtuais, das paixões de chat, do sexo na webcam.” Essa é a burla tentativa e não somente uma mera sugestão do mundo “pós-moderno” de levar o contato humano ao superficialismo onírico, relativo somente a sonhos, relativo a satisfação da vontade egoísta ou padrões utilitaristas. O discurso pós-moderno se eleva cada vez mais à atitude solitária de realização e satisfação pessoal. Os amores cibernéticos, as amizades virtuais, vão se tornando mais atraentes do que o contato da amizade e o cheiro vivo de alguém necessitado, com fome na alma.
Segundo o Ibope Media, já somos 105 milhões de internautas, sendo o Brasil o quinto país mais conectado do mundo. Somos uma geração conectada, basta nos questionarmos que tipo de conexão estamos deixando tomar um bom espaço de nossas vidas, nossos valores, famílias e relacionamentos. Mesmo sem perceber, somos imersos na coluna do individualismo atual. Não precisamos mais ver gente, conversar com pessoas em volta de uma mesa, porque já temos “500 amigos” no facebook! Nos tornamos cada vez mais introspectivos, sozinhos, mesmo com tanta gente por perto.
É realmente apaixonante a proposta do Cristo do Evangelho, ou até mais, intrinsicamente necessária. A proposta do Mestre, nada menos que o Deus dos relacionamentos, é trazer a nós a proximidade humana e divina ao mesmo tempo, diz Ele: “Com isso saberão que vocês são meus discípulos, se vocês amarem uns aos outros” (Jo 13.35). Uma proximidade “outrocêntrica” que se doa mais do que recebe. Que se conecta na preocupação de outrem. O Deus da Bíblia se mostra cada vez mais comunitário, à medida que o conhecemos na “bigorna latente” de sua vontade. O convite para seguir Jesus é um convite para a vivência mútua.
A referência pessoal nos faz crescer no amor, na compaixão, na doação e também em humanidade. Os “robôs” ou facetas cibernéticas de relações são mais atraentes quando não se tem vontade de aprofundar-se em descobrir que tipo de gente realmente somos ou estamos nos tornando. Como disse Ed René Kivitz: “Quem não quer crescer, vencer limites emocionais, reescrever sua história, exorcizar seus demônios, fica sozinho ou pula de paixão em paixão, em relações que são eternas enquanto duram”.
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