A deficiência de uma pessoa não define a sua capacidade em servir
Deficiência é o termo usado para definir a ausência ou a disfunção de uma estrutura psíquica, fisiológica ou anatômica. Este conceito foi definido pela Organização Mundial de Saúde. O termo “deficiente” para denominar pessoas com deficiência tem sido considerado inadequado por algumas ONGs e cientistas sociais, pois o termo leva consigo uma carga depreciativa da pessoa.
Há seis anos, eu não estava incluída nessa classificação e muito menos havia analisado a definição do termo em questão. Casada, mãe de três filhos, atuante na igreja, em uma manhã, ao levar meu filho caçula, na época com três anos de idade, ao colégio, percebi que minha visão se afunilou rapidamente. Eu estava dirigindo meu carro e só via por um pequeno ângulo como se fosse um funil, e uma dor muito forte no meu olho esquerdo se iniciava aumentando gradativamente. Eu pedi a Deus: “Me ajude Senhor, preciso chegar até um ponto seguro”. Ele me levou até a casa da minha irmã, que me levou ao hospital. Eu já não conseguia abrir os olhos, estava muito inchado, vermelho, e a dor era insuportável. O diagnóstico foi glaucoma agudo (pressão alta ocular).
Importante ressaltar que o glaucoma pode ser controlado com medicamentos, tratamento adequado. No meu caso, mesmo sem nenhum trauma, não houve tempo hábil para isso. Os médicos acreditam que um descolamento da retina dois meses antes pode ter causado o glaucoma. Por isso a importância de acompanhamento anual no oftalmologista e qualquer dor nos olhos, não se deve demorar para procurar ajuda de um profissional.
Sete cirurgias em três meses
Passei por sete cirurgias no olho em apenas três meses. Duas, dessas cirurgias foram injeções direto no olho com anestésico para amenizar a minha dor por algum tempo. Eram necessárias três enfermeiras para segurar minhas pernas e braços enquanto o médico aplicava a injeção, consegue imaginar a minha dor? Deus sabe, Ele estava comigo naquela sala de cirurgia!
Foram dias de escuridão dentro do quarto, eu não podia ver a luz e qualquer barulho era como uma facada no meu olho. A igreja estava orando, os irmãos fizeram campanha de oração para Deus entrar com providência, e quando os médicos iriam arrancar o meu olho, a dor cessou. A ausência da dor naquele momento também veio acompanhada da ausência da luz, pois eu havia perdido a visão total do olho esquerdo, me tornando deficiente visual monocular. Só quem tem uma deficiência, qualquer que seja, sabe suas dificuldades. Eu tive que aprender algumas coisas novas como: descer ou subir escadas com cautela (monocular não possui visão em profundidade) e poderia cair. Quebrei muitos copos, pratos e também batia minha cabeça no registro do chuveiro, eu achava que estava longe das coisas e me machuquei algumas vezes. Tive que renovar minha habilitação de motorista com a nova classificação e o cuidado no trânsito foi redobrado.
Eu me sentia feia, olho azulado, minha autoestima estava muito baixa e tive medo até de perder meu esposo. Entrei em depressão. Para a empresa que eu trabalhava, na época como gerente administrativa, eu não era mais uma profissional fisicamente apresentável.
Decidi sair daquela empresa onde prestava serviços há dez anos e abri uma empresa de limpeza em sociedade com minha irmã que mantemos ativa até hoje. Há dois anos Deus me abriu também uma porta de trabalho em uma das maiores multinacionais do ramo automobilístico, onde sou contratada na area financeira, que é minha formação, e conquistei uma vaga especial para PCD (pessoa com deficiência). Se eu não tivesse essa deficiência talvez nunca teria a oportunidade de estar lá. Deus já sabia onde ele iria me colocar, Ele é maravilhoso!
A deficiência de uma pessoa não define a sua capacidade em servir.
Eu sempre fui muito ativa como profissional e também na igreja. Precisava transformar minha luta em superação. Fui convidada pela Regional Paulistana para liderar o ministério de mulheres regional e aceitei o desafio. Como foi transformador para mim liderar essas mulheres. Que ministério lindo Deus me concedeu! Eu me reencontrei.
Com apenas um olho, eu passei a enxergar melhor do que antes. Minha experiência me tornou mais forte e minha aparente deficiência me tornou capaz de fazer coisas melhores do que antes porque estava sensivel à voz e a orientação de Deus.
Agora estou perto de fazer a última cirurgia, terei que tirar o olho e colocar uma prótese. Estou certa que esse é o melhor para mim, Deus me preparou para isso!
Tenho deficiência mas não sou ineficiente. Quantos possuem qualquer outra deficiência e são tratados como inválidos, incapazes, menos habilitados para exercer uma função e até são menos remunerados com a mesma função de uma pessoa “normal” somente por conta dessa classificação PCD. Diante dessa situação, não se vitimize, siga em frente, você tem valor!
É importante deixar claro que, algumas atividades precisam de alguns cuidados e critérios e a deficiência pode sim ser uma limitação, porém, seja você um agente de amor e olhe para essas pessoas com olhar de igualdade, mesmo que seja com apenas um olho, como o meu.
Dsa. Gislaine Cuenca Neves é Diretora do Ministério de Mulheres da Regional Paulistana, Formada em Administração de Empresas e Gestão Financeira. Congrega na IAP de Vila São Pedro (São Bernardo do Campo, SP).