O amor verdadeiro não nasce das borboletas no estômago, mas se prova nas escolhas diárias de quem resolve ficar quando seria mais fácil ir embora.
Reassisti ao filme ‘Um Amor para Recordar’ (2002), depois de muitos anos, por pedido (leia insistência) da minha esposa. Dos gêneros de filmes que gosto, esse é definitivamente não é o favorito. Mesmo assim, cedi (como com quase tudo que ela me pede). Curioso como o título se tornou ironia involuntária: eu “gravei” o filme, mas de um jeito completamente novo. Na época em que o assisti pela primeira vez (também com ela), eu fui impactado pelo romance de Landon e Jamie. Agora, já não assisto com os mesmos olhos. Muitos anos se passaram. Hoje sou pai, e ser pai muda tudo, até o que achamos que já entendemos sobre o amor.
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O que antes era só emoção adolescente, agora revela uma profundidade que eu nem imaginava. Descobri que o amor verdadeiro não nasce das borboletas no estômago, mas se prova nas escolhas diárias de quem resolve ficar quando seria mais fácil ir embora. É na casa onde há compromisso que o amor amadurece, rompe a casca da paixão e cria raízes na renúncia.
Landon começa o filme imaturo, refém das risadas ocas do grupo e apaixonado por si mesmo. Jamie é o oposto: o tipo de pessoa rara, que ama sem alarde, com aquele zelo que nasce de quem crê que a fé não se negocia, nem mesmo para caber nos sonhos dos outros.
Na época, precisei romper com o estereótipo do clássico filme tipo, a Dama e o Vagabundo. Feito isso, a beleza do que acontece entre eles não é o clichê do “opostos se atraem”, mas o poder do amor altruísta: Jamie não tenta transformar Landon em alguém melhor para si mesma. Ela simplesmente o ama. Só isso. E, às vezes, só isso é tudo. Amor de verdade não precisa de troféu, apenas de entrega. Amor que serve, que se faz, e que permanece mesmo quando sabe que o tempo é curto.
Lendo Efésios 5:25, vejo o roteiro escrito na prática: “Maridos, amem suas esposas como Cristo amou a igreja.”. Não é amor interesseiro, condicional, sujeito ao desempenho, ou até mesmo, a recíproca. É o amor que escolhe ficar, que permanece mesmo quando o mundo diz para buscar novidades. É o contrário do que o cinema ensina hoje, onde o amor virou contrato negociado. Por isso ‘Um Amor para Recordar’ soa quase escândalo: lembra que amar é coisa para quem aceita a cruz.
Os protagonistas precisam abrir mão cada um de algo em si mesmo. Sim! Até mesmo, algo que se ama, algo que se almeja. Até mesmo o pai de Jamie, precisa abrir mão do ‘pragmatismo’ da religião para a união conjugal, em nome de aceitar o inesperado amor que pode de transformar. É abrir mão do futuro já projetado, para viver o novo apresentado no presente. É se comprometer com aquilo que será amanhã, mesmo quando o presente não me agrada. Isso nos arrepia, mas ao mesmo tempo, é benção!
Agora, como pai, fico imaginando o que desejo que minha filha viva um dia e o tipo de homem que quero formar no meu filho. Que aprendam: amar é servir! Casar é permanecer. Prometer é cumprir mesmo no silêncio. E, se possível, que eles escolham aquele amor que não busca a si mesmo, mas ao outro. Que possam aprender com uma pessoa que personifica o amor. Que possam aprender com Cristo, que não existe maior amor, do que dá alguém sua própria vida por outrem (Jo 15.13-15)! E talvez seja isso que ‘Um Amor para Recordar’ nos faça lembrar: amar, antes de ser um sentimento, é uma escolha diária. Uma decisão que exige de nós aquilo que o mundo desaprendeu a oferecer: a renúncia.
Tempo de “Eulatria”
Para o nosso tempo, nunca foi tão necessário repetir essa verdade simples e eterna: amor é, sobretudo, abandonar. Uma das marcas do nosso tempo é a “Eulatria”. O culto à autoimagem. Conquanto não haja louvor e celebração a si mesmo, a maior evidência disso é o resultado. Gente que só permanece enquanto se “vê” realizada. Só fica, se feliz. Só é possível ser nós, enquanto você me realiza. Caso contrário, estou melhor sozinho. E nesse caso, solidão aqui não é autocuidado (solitude), mas isolamento egoísta mesmo.
O apóstolo Paulo, escrevendo aos Filipenses, falou de Cristo como aquele que “não considerou que ser igual a Deus era algo a que devia apegar-se, mas esvaziou-se a si mesmo” (Fp 2:6-7). Amar é exatamente isso: esvaziar-se. Não de valor, mas de vaidade. Não de identidade, mas de ego. É abrir mão da própria vontade para que a vontade do outro, e a graça de Deus, possa florescer. É abdicar de si mesmo pela alegria de ver o outro inteiro. É trocar o “eu quero” pelo “nós podemos”. Porque o amor verdadeiro, o que permanece, o que transforma, o que reflete o próprio Cristo, é aquele que serve, se entrega e se alegra em doar-se.
Talvez eu tenha mesmo assistido a um filme antigo. Mas o que o tempo trouxe foi uma lembrança viva: o amor de verdade a gente não vê só na tela. A gente aprende, sacrifica e constrói. No fim das contas, o que gravei ao rever o filme foi mais do que uma história de amor bonito. E, se for para gravar, que seja sempre o amor que não deixa de ser amor mesmo quando a história muda. Recordei que amar, de fato, é morrer um pouco para que o outro possa viver plenamente.
Ps: toda história de amor, é um plágio barato do maior ato que o mundo já viu (Jo 3.16).
Gustavo Rocha | Casado com Bruna e pai de Samantha e Tito; Pastor na Promessa Bom Retiro e Maracanã, em Sumaré; Formado em Teologia Pelo CETAP e estudou Cinema e ama cinema desde criança.
Foto de capa: Internet.











